Um homem de aproximadamente 40 anos carregava um menino que aparentava 12 anos no colo, indo da entrada da emergência do Hospital Regional de Planaltina (HRPL) para o estacionamento. Ao avistar a equipe do Sindicato dos Médicos do Distrito Federal (SindMédico-DF), ele dispara: “esse hospital não funciona. Trouxe meu filho desmaiado e eles dizem que não tem como atender. A gente não precisa passar por uma humilhação dessas”.
Essa foi a situação com a qual o presidente do SindMédico-DF, Dr. Gutemberg Fialho, se deparou antes mesmo de entrar no prédio. Na recepção cheia, ouviam-se gemidos de dor e viram-se olhares de esperança ao verem entrar um homem usando um jaleco branco: “o médico chegou!” pareciam exclamar.
Ao adentrar a área interna do hospital, os olhares angustiados continuavam espalhados pelos corredores, onde macas se sucediam enfileiradas. Pacientes ficam internados ali enquanto as reformas na unidade de saúde avançam.
Condições adversas de trabalho no Hospital de Planaltina
Era perceptível também nos semblantes e na fala dos servidores uma nota de ansiedade: nunca se viveu uma crise tão séria no Hospital de Planaltina. “Nunca foi fácil a rotina aqui, mas nunca chegamos a uma situação tão ruim”, afirmou uma médica. Apesar das dificuldades crescentes, as equipes se esforçam para não deixar os pacientes desassistidos.
No entanto, as condições de trabalho adversas, a sobrecarga de serviço e os salários pouco atrativos, aliados à distância entre o HRPL e o centro de Brasília e os casos de agressão que se avolumam junto com a insatisfação e desespero de pacientes e acompanhantes. Tudo isso tem levado ao adoecimento dos profissionais, à evasão dos médicos lotados na unidade e à baixa adesão dos que são aprovados em concursos públicos.
A equipe de pediatras, que deveria ter 52 médicos, contava com apenas 15 desses especialistas. Quatro médicas da equipe são gestantes – uma já em licença e outras três que logo terão que se afastar do atendimento. Duas delas cogitam se demitir após a licença maternidade. Outros pensam em antecipar a aposentadoria ou a demissão, caso o GDF não tome providências para reverter o caos em que está lançada a assistência pública à saúde no DF.
“Devo me aposentar em um ano e meio. Se as condições de trabalho fossem boas eu permaneceria, mas não do jeito que está”, afirmou o pediatra de plantão. “Quando atendo sozinho aqui, não vou nem almoçar. Se tenho que ir ao banheiro, fico nervoso”, relatou.
Hospital de Planaltina tem déficit generalizado de médicos
O déficit de profissionais no Hospital de Planaltina é mais grave na pediatria e na clínica médica, que contam com menos da metade dos médicos necessários para o funcionamento da estrutura atual da unidade de saúde.
Mas a insuficiência de especialistas também abrange a ginecologia e obstetrícia, a anestesia, a ortopedia e a cirurgia (veja a tabela ao fim do texto). O Governo do Distrito Federal (GDF), no entanto, parece ignorar a situação e anuncia ampliação dos atendimentos com a construção de um bloco auxiliar.
Em dois pavimentos, a nova estrutura oferecerá 30 leitos de enfermaria, 13 de internação pediátrica, nove de terapia intensiva e nove cadeiras para diálise. Não há, entretanto, anúncio de ampliação do quadro de profissionais de saúde.
Pior do que não oferecer condições para ampliação da oferta de serviços médicos à população de Planaltina, o GDF trabalha com a perspectiva de unificação da pediatria dos hospitais de Planaltina e Sobradinho.
“Essa proposta resolve um problema da Secretaria de Saúde, mas não o problema da população. Como a diretora do Hospital de Planaltina aponta, a população da cidade tem baixo poder aquisitivo. Quando uma mãe leva um filho ao hospital, leva toda a família junto. Não vão ter nem dinheiro para o transporte para Sobradinho, quanto mais para se alimentar”, aponta Dr. Gutemberg. O SindMédico-DF tem uma proposta pronta há meses para apresentar ao governador, que permitiria que a SES-DF voltasse a ser capaz de contratar médicos. Até agora, mesmo com a mediação do Ministério Público do Trabalho, o governo não se dispôs a negociar. “Tudo direciona para que, em breve, os médicos comecem a realizar protestos e paralisações, para que o governo sente à mesa de negociações. No caso de Planaltina, a população também já se prepara para manifestações em defesa do hospital público da cidade”, informa o presidente do SindMédico-DF.